Há alguns anos, uma colorada paranaense pediu que eu fizesse um texto para ela homenagear seu pai, que saiu cedo do Rio Grande do Sul, nunca foi ao Beira-Rio, mas manteve firme seu coloradismo, convertendo toda a família que formou no Paraná à religião alvi-rubra. Em tempos de reforma do Beira-Rio, em que certamente todos os colorados se sentem meio órfãos, com a falta da sua casa, achei interessante postar o texto, que fala um pouco desse sentimento.
Saudações, Oh Gigante:
Durante muito tempo, eu esperei
este momento!
Por vários anos, meu sentimento era
muito mais fé que certeza. Eu acreditava na sua existência, sem poder vê-lo.
Mas jamais duvidei de sua imponência.
Na infância mais tenra, um radinho
de pilha cheio de estática, enfiado embaixo das cobertas, em uma noite fria de
inverno, ou sentado no quintal, em uma quente tarde de verão, eu acompanhei as
peripécias dos 11 guerreiros que defendiam tua casa, e invejei, salutarmente, a
sorte dos milhares de assistentes destas aventuras.
Em momentos de maior felicidade,
podia ver os heróis rubros baterem-se pela TV, fosse no Gigante, ou em
expedições guerreiras por territórios inimigos. Me agradava muito quando
invadíamos o território dos maldosos gremistas, nossos arqui-inimigos, e
trazíamos seu escalpo para pregar na entrada da nossa casa. Digo nós, por que
me sentia presente em alma e pensamento, apesar da distância física.
As vezes me sentia diminuído,
quando ouvia exortações do tipo: “lugar de colorado é no Beira-Rio!” Gostaria
muito de estar lá, vibrar com o time, festejar com a torcida, mas tudo parecia
ocorrer em outro planeta. Mas eu sei que o coração de um gigante é imenso, e
alcança os sentimentos de afeto pelo clube, por mais distantes que estejam.
Se há o lado negativo desta
distância, não poder compartilhar o dia a dia do clube, há o lado positivo,
fantasioso, da paixão pelo futebol. Os jogadores deixam de ser seres humanos,
para tornarem-se semi-deuses. Suas jogadas, mais do simples lances de uma
partida, passam a simbolizar a eterna luta do bem contra o mal. Os estádios
tornam-se templos sagrados de uma misteriosa religião, onde apenas os eleitos
têm acesso. E o radinho tem a força mágica de transformar qualquer jogador em
um craque, os lances favoráveis ao adversário em falhas do juiz, e todo gol
colorado em uma pintura.
As vezes pensava: quando ele vier
jogar aqui, eu irei assistir a partida. Mas para meu azar, minha cidade fica
fora da rota dos grandes acontecimentos esportivos. Posso apenas torcer para
que venha jogar alguns quilômetros mais perto do que no Templo Sagrado.
Mas hoje estou aqui: olhando a
imponência do Gigante da Beira-Rio! Não importa que não tenha jogo. Respirar o
ar que alimentou o fôlego de Falcão, Figueroa, Valdomiro e Fernandão, já me
basta. Posso imaginar a torcida descendo pelas rampas, gritando “É Campeão”.
Nunca fiz isso presencialmente, mas foram muitas as conquistas em que estive
aqui em espírito. Agora posso me orgulhar. O que sinto, os assíduos
freqüentadores do estádio não sentem. Não se emocionam com cada detalhe, um
escudo do clube aqui, uma foto de um ídolo ali, um pedaço de ingresso lá
adiante. Aquilo que é cotidiano para alguns, é mágico para mim. Não precisava
estar aqui, para acreditar em sua existência, mas estar aqui renovou minhas
energias, para continuar torcendo à distância.
Bah... lindo demais, me emocionei! Parabéns professor Raul!
ResponderExcluirObrigado, Regina!
ResponderExcluirNão foi muito difícil escrever esse texto, pq morei no interior por muitos anos, e vivenciei essa realidade, mesmo que eventualmente assistisse algumas partidas no Gigante.