Seleção gaúcha com o uniforme do Flamengo, na partida contra a seleção baiana.
Em junho de 1922, a Federação Rio Grandense de Desportos
(FRGD) começou a preocupar-se com a organização do “scratch” que representaria
o estado no primeiro Campeonato Brasileiro de Seleções.
O futebol da capital estava dividido desde 1920, e dos
principais clubes da cidade, apenas o Grêmio permanecia fiel à FRGD. Com isso,
coube a esse clube ser a base da seleção. Em tempos de amadorismo, formar um
selecionado que jogaria fora do estado era algo difícil. Os jogadores do Brasil
de Pelotas chamados a treinar no “scratch” não puderam comparecer em Porto
Alegre, pois não obtiveram licença de seus empregadores. O presidente da FRGD,
Paulo Hecker, teve que interferir pessoalmente aos dirigentes da Fiscalização
de Serviços da Barra e ao Banco Nacional do Comércio, para conseguir a
liberação de Coroliano e Miranda, atletas do Rio Grande.
Após vários treinos na capital, onde foram testados vários
jogadores, no dia 16 de julho a seleção gaúcha partiu para Curitiba, onde
enfrentaria os paranaenses. Os atletas que embarcaram foram os seguintes:
Goleiros: Lara (Grêmio) e Marcelino (Riograndense SM)
Zagueiros: Presser (Ruy Barbosa), Neco (Grêmio) e Romagna
(Guarany de Cruz Alta)
Médios: Alfredo (Ruy Barbosa), Xingo (Pelotas), Quincas
(Pelotas) e Luiz Assumpção (Grêmio)
Atacantes: Leon (Ruy Barbosa), Lagarto (Grêmio), Bruno
(Grêmio), Mosquito (Riograndense SM), Ramão (Grêmio), Willy (Riograndense SM),
Barros (Tamandaré SM) e Faeco (Pelotas)
No dia 23 de julho, no campo do Internacional, em Curitiba,
mais de 10 mil pessoas comparecem para apoiar a equipe paranaense, no jogo
eliminatório que valia o título da Região Sul. O árbitro era o carioca Carlos
Miranda dos Santos. As equipes foram assim a campo:
RS: Lara; Presser e Neco; Quincas, Xingo e Alfredo; Leon,
Lagarto, Willy, Mosquito e Ramão
PR: Hermógenes; Albano e Rosa; Rigolino, Falcico e Ninho;
Maximino, Zito, Arthur, Joaquim e Djalmo
Os principais movimentos da partida ocorreram no início. Aos
9’, Mosquito lançou Leon em velocidade, pela esquerda. O jogador do Ruy Barbosa
foi à linha de fundo e cruzou para Willy cabecear para o fundo das redes:
gaúchos 1x0! Na saída de bola, os paranaenses atacaram com perigo e Alfredo
derrubou Zito, na área. Arthur cobrou a penalidade, defendida por Lara, mas o
mesmo jogador pegou o rebote e chutou para as redes. Estava empatada a partida
aos 10’ de jogo. Depois, o jogo caiu em rendimento. Os gaúchos jogaram a
segunda etapa com dez atletas, pois Alfredo, lesionado, não voltou do
intervalo, e não existiam substituições. Mesmo assim, a imprensa gaúcha
ressaltou que o juiz deixou de marcar dois pênaltis clamorosos para o Rio
Grande do Sul. O empate obrigou à realização de uma nova partida, no dia
seguinte.
No dia 24 de julho, no mesmo campo do Internacional, com o
mesmo árbitro Carlos Miranda dos Santos, diante de outro público de mais de 10
mil pessoas, as duas equipes voltaram a enfrentar-se. Os times estavam assim
formados:
RS: Lara; Presser e Neco; Faeco, Xingo e Alfredo; Leon,
Lagarto, Willy, Mosquito e Barros
PR: Hermógenes; Albano e Rosa; Rigolino, Pena e Ninho;
Maximino, Zito, Arthur, Joaquim e Taurizano
A partida começa com os gaúchos atuando adiantados, e em um
contra-ataque, logo no inicio, Zito avançou em velocidade e abriu o placar para
os paranaenses. Aos 14’, novo contra-ataque, mas Alfredo saiu em busca de Zito
e chocou-se com ele. O médio-esquerdo gaúcho, que já havia se lesionado no
primeiro jogo, precisou abandonar a partida, com fratura na clavícula esquerda.
Novamente os gaúchos ficavam com dez em campo, e perdendo de 1x0. Tudo parecia
desfavorável, mas a seleção reagiu. Aos 30’, Lagarto passou para Xingo, que
chutou forte para empatar. No 2º tempo, mesmo com um jogador a menos, a seleção
gaúcha foi para cima dos adversários. Pena cometeu pênalti em Lagarto, que
Xingo cobrou e virou o jogo. A seguir, Mosquito lançou Barros, que avançou pela
ponta e chutou cruzado para fazer o 3º gol gaúcho. Os paranaenses ainda
descontam, quando Maximino escapou pela direita e marcou. Mas em seguida,
Lagarto e Leon tabelaram, e quando Hermógenes saiu do gol, Leon chutou para as
redes. Placar final: Rio Grande do Sul 4x2 Paraná.
Com esse resultado, o Rio Grande do sul classificou-se para
o Quadrangular Final, com as seleções de São Paulo, Distrito Federal (cidade do
Rio de Janeiro) e Bahia, que seria disputado no centro do país. No dia 25 de
julho, embarcaram para São Paulo, onde encontrariam o resto da delegação,
Dorival e Totte (Grêmio) e Miranda (Rio Grande).
Os gaúchos chegaram a São Paulo no dia 27 de julho. No dia
30, uma surpresa: no Rio de Janeiro, os cariocas empataram com os baianos em
2x2.
Em 2 de agosto, os gaúchos entravam em campo, na Chácara da
Floresta, para enfrentar a poderosa seleção paulista, de Friedenreich e Neco, e
que nas eliminatórias havia batido Minas Gerais por 13x0. O árbitro era o
carioca Henrique Vinhaes. As equipes foram a campo com a seguinte formação:
RS: Lara; Presser e Neco; Faeco, Xingo e Dorival; Leon,
Lagarto, Willy, Mosquito e Barros
SP: Primo; Bianco e Barthô; Bertolini, Amílcar e Gelindo;
Formiga, Heitor, Friedenreich, Neco e Rodrigues
Apesar de todo favoritismo paulista, aos 10’ de jogo Barros
escapou em velocidade e chutou para o gol. O chute foi fraco, e Primo chegou a defendê-la,
mas deixou a bola escapar entre suas mãos e morrer no fundo das redes. Aos 15’,
em nova escapada, Barros chutou, a bola desviou em Bianco e foi para o fundo
das redes: gaúchos 2x0. Ainda no 1º tempo, aos 39’, os paulistas reagem,
Formiga cruzou para a área e Friedenreich cabeceou para as redes. No 1º minuto
do 2º tempo, Formiga caiu na área, e o juiz deu pênalti, questionado pela
imprensa gaúcha. Friedenreich cobrou o pênalti e marcou, empatando o jogo.
Depois disso, a partida transcorreu sem grandes emoções, fora uma lesão de
Lara, após chocar-se com Rodrigues. A partida ficou vários minutos parada, e
quando Lara voltou, ainda preferiu sair de campo, deixando Mosquito no gol por
dois minutos, até regressar a campo. A paralisação gerou uma confusão. Na
época, era o cronometrista que marcava o tempo, e não o juiz. E um sinal do
mesmo, em um momento que o jogo parou, gerou a impressão que a partida havia
acabado. Os jornalistas gaúchos telegrafaram para Porto Alegre, anunciando o
empate. Mas a bola voltou a rolar. E aos 35’, pouco depois do falso fim, Neco
acertou um chute, virando a partida. Aos 37’, Rodrigues chutou rasteiro para
fechar o placar: São Paulo 4x2 Rio Grande do Sul. E muita reclamação da
imprensa gaúcha sobre a conduta do juiz.
Uma notícia divulgada pouco antes da partida irritou gaúchos
e paulistas. A CBF teria declarado que o torneio não era campeonato brasileiro,
e sim um festival de futebol para preparar os futuros jogadores da seleção
brasileira que disputaria os Jogos Latino-Americanos. O motivo dessa decisão
teria sido o empate dos cariocas com baianos, que deixaram os mesmos em posição
de inferioridade na disputa pelo título. Realidade ou não, essa decisão não
prevaleceu, e o torneio valeu como campeonato brasileiro.
No dia 6 de agosto, havia rodada dupla. Em São Paulo,
paulistas x baianos, no Rio, cariocas x gaúchos. Os paulistas venceram seu jogo
por 3x0. No Rio, em General Severiano, Carlos Miranda dos Santos, o mesmo
árbitro carioca dos confrontos contra os paranaenses, comandaria a partida. As
duas equipes foram assim a campo:
RS: Lara; Presser e Neco; Quincas, Xingo e Dorival; Leon,
Lagarto, Willy, Faeco e Barros
DF: Haroldo; Palamone e Chico Netto; Laís, Alfredinho e
Fortes; Leite, Zezé, Pastor, Junqueira e Antenor
Nos primeiros 15 minutos de jogo, os cariocas dominaram. Mas
aos poucos os gaúchos passaram a controlar a partida. Em um ataque perigoso,
Barros acertou um chute na trave. Mas aos 33’, Laís lançou Junqueira, impedido,
que passou para Zezé marcar. No 2º tempo, os cariocas predominaram, e aos 21’,
Fortes cruzou para a área, Lara escorregou e Leite apanhou a bola, passando
para Zezé marcar novamente. Placar final: Distrito Federal 2x0 Rio Grande do
Sul.
No dia 10 de agosto, na Rua Paissandu, enfrentaram-se as seleções do
Rio Grande do Sul e Bahia. O árbitro foi o carioca Carlos Santos. Na
preliminar, o segundo time do Flamengo venceu por 2x1 o River, campeão da 2ª
divisão carioca. Depois, na hora de entrar em campo, um problema: as duas
seleções tinha uniformes semelhantes. Assim, os gaúchos jogaram com o uniforme
do Flamengo. As duas equipes foram a campo com a seguinte formação:
RS: Lara; Presser e Neco; Quincas, Xingo e Faeco; Leon,
Lagarto, Willy, Mosquito e Barros
BA: Baby; Durval e Santinho; Mica, Popó e Nebulosa; Asterio,
Petiot, Vivi, Manteiga e Sandoval
A partida foi parelha, com os gaúchos predominando no 1º
tempo e os baianos na 2ª etapa. E aos 25’ do 2º tempo, Manteiga cruzou para
Petiot marcar o único gol do jogo. Placar final, baianos 1x0 gaúchos. No dia 13
de agosto, em São Paulo, os paulistas venceram os cariocas por 4x1, ficando com
o título brasileiro.
Da seleção gaúcha que disputou o primeiro campeonato
brasileiro, o ponteiro-esquerdo Barros, no ano seguinte ingressou no
Internacional. O goleiro reserva Marcelino seguiu o mesmo caminho, em 1924. O
lateral-esquerdo Alfredo, irmão do atacante Leon, jogou no Internacional de
1931 a 1933.
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