Em 30 de setembro de 1940, uma segunda-feira, a comunidade esportiva da capital gaúcha foi surpreendida com a denúncia de tentativa de suborno de quatro atletas colorados por parte de um dirigente do Grêmio.
A história começou a vazar no final de semana. Ao chegar no estádio da Timbaúva, o delegado Renato Souza (presidente do Grêmio em 1963 e 1964), onde comandaria a segurança de Internacional x Cruzeiro, foi informado por João Martins Rangel sobre a denúncia. Mas o que havia acontecido?
Na segunda-feira, 30 de setembro, compareceram no gabinete do delegado Renato Souza, na rua Duque de Caxias, o presidente colorado, Hoche de Almeida Barros, o técnico colorado, Orlando Cavedine e o zagueiro Alpheu Cachapuz Batista. O craque colorado acusou o secretário geral gremista Cecílio Gomes de tentar suborná-lo. Em troca de facilitar a vitória gremista, o zagueiro colorado receberia 500$000 e uma indicação para jogar no Rio de Janeiro. A reunião teria ocorrido na casa do dirigente tricolor, na rua Farias Santos, no bairro Petrópolis. Após a conversa, o dirigente entregou metade de uma nota de 500$000, que o jogador entregou ao delegado, prometendo a outra metade após o clássico. Alpheu imediatamente procurou a direção colorada e contou a história. Logo se descobriu que mais três jogadores haviam sido assediados.
A justificativa da presença de Alpheu em sua casa, apresentada por Cecílio, é de que o jogador namorava uma de suas empregadas, chamada Odete. O zagueiro confirmou o namoro, mas declarou que já terminara a relação fazia dois meses, quando foi chamado por Cecílio para uma conversa. A imprensa, favorável ao dirigente, tratou com desprezo e preconceito o romance.
Apesar de tentar menosprezar a declaração de Alpheu, e dos outros atletas colorados, o Diário de Notícias chegou a publicar uma edição extraordinária na segunda-feira, dia que o jornal não circulava, com o depoimento do jogador. Infelizmente, essa edição não está disponível no acervo online da Biblioteca Nacional.
O outro técnico colorado (o clube tinha dois técnicos), Carlos De Lorenzi, declarou que mais três atletas do clube haviam sido procurados pelos subornadores: os médios Assis e Magno, e o goleiro Marcelo. Ao goleiro foi oferecido 2:000$000, caso jogasse (era goleiro do 2º quadro, mas havia atuado nos dois jogos anteriores, substituindo o titular Júlio). Para o centromédio Magno, foi oferecido 1:000$000. Marcelo se negou a fornecer o nome do emissário gremista à imprensa, mas disse tratar-se de pessoa conhecida e influente no clube. Já Magno disse não conhecer a pessoa que o procurou. Quanto a Assis, que morava na Pensão São Rafael, os dois emissários gremistas não o encontraram, pois ele estava tomando chimarrão fora do quarto.
Assis e Magno foram igualmente desqualificados pela imprensa, que referia-se a Assis como um jogador que estava ganhando fama com o caso, e a Magno, de forma indireta, criticando o fato de ter sido um jogador profissional mesmo antes da adoção oficial do regime.
A referência a Pimenta é que o técnico da seleção brasileira, Ademar Pimenta, havia convocado Assis, ao lado de Tesourinha, Carlitos e Alpheu, para disputar o Campeonato Sul-Americano na Bolívia, que acabou cancelado.
Alpheu também foi desdenhado, como profissional, que ainda era considerado um termo pejorativo.
A "fuga" do Santos era uma referência maldosa ao fato de que Alpheu havia assinado contrato com o Santos, no início de 1938, época que a dupla Gre-Nal estava fora da CBD. Mas pouco depois a dupla acertou-se com a entidade principal do futebol, e o Internacional exigiu que seu contrato com Alpheu fosse reconhecido. Assim, os dois clubes chegaram a um acerto: Alpheu jogou a temporada de 1938 no Santos e depois voltou ao Colorado. Sem fuga, sem ilegalidade.
Marcelo foi tratado de forma menos desdenhosa:
Cecílio Gomes, no dia seguinte, prometia ingressar com uma queixa-crime por calúnia contra Alpheu. O presidente e técnico do Grêmio, Telêmaco Frazão de Lima, disse não acreditar nas denúncias, mas deixou uma porta aberta para uma possível punição do dirigente, caso fosse confirmada a denúncia.
Na quarta-feira, ao dar espaço para Cecílio Gomes se manifestar, o jornal Diário de Notícias começou exaltando a carreira do mesmo, promotor público de 1920 a 1924 e professor da Escola Superior de Comércio. Mas o dirigente gremista limitou-se a dizer que se defenderia oportunamente e que buscava um "desagravo sem ódio". Aos mesmo tempo, surgiam boatos de que ele renunciaria ou pediria licença do cargo na direção gremista. Além disso, ele havia convidado o dirigente colorado Pery Azambuja Soares para uma conversa, buscando uma forma de pacificação. No mesmo dia, o Internacional anunciou que abriria uma caixa de subscrição, cujo valor arrecadado seria repassado a Alpheu, como prêmio por sua lealdade ao clube.
Na quinta-feira, os presidentes de Internacional e Grêmio reuniram-se, para discutir a situação. Mas o caso some da imprensa. No domingo noticia-se que estava para ser assinado um Pacto Gre-Nal, onde nenhum clube assinaria contrato com jogador pertencente ao rival. Os dias passam e a história desaparece por completo.
No dia 20 de outubro, domingo, os dois rivais se enfrentam na Timbaúva, na maior renda já obtida em Porto Alegre, até então: 31:857$000. O Internacional, com Alpheu, Assis e Magno em campo, venceu por 4x3 e encaminhou a conquista do título.
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