Vicente Lomando Rao nasceu em Porto
Alegre, em 4 de abril de 1908, exatamente um ano antes da fundação do Sport
Club Internacional, clube que ele tanto amaria em sua vida.
Filho de italianos, Rao retornou à terra
de seu pai em 1914, residindo em Polístena, uma pequena cidadezinha da região
da Calábria. Após o fim da I Guerra Mundial, a família Rao voltou a Porto
Alegre. Nesse momento, segundo o próprio Rao, ele começou a se empolgar com o
futebol.
Em 1926, Vicente Rao ingressou no
Internacional, na condição de atleta do 2º quadro. Atuava de center-half. Em 25
de abril de 1926, Rao estreava no Internacional, pelo campeonato do 2º quadro,
na Rua Larga, campo do Americano. E o Colorado venceu por 5x2. Era a
inauguração da Rua Larga.
No final de semana seguinte, surge a
grande chance. O titular Lampinha, ídolo da torcida, não poderia jogar, e Rao
foi escalado contra o São José, na Chácara dos Eucaliptos, pelo campeonato. O
Internacional venceu por 4x1 e Rao marcou o 3º gol colorado. O jornal A
Federação assim se referiu à atuação de Rao: “O quadro alvi-rubro,
ressentindo-se da falta de seu centro-medio, actuou com certa indecisão, pois
Ráo, ainda é muito novo, para actuar em partidas de certa
responsabilidade."
Apesar do começo promissor, a partida
contra o São José seria a única na equipe principal. Rao disputou o campeonato
de 1926 e de 1927 pelo 2º quadro colorado. Mas a linha média titular era
formada por Ribeiro, Lampinha e Paulo, os dois primeiros craques consagrados, e
o terceiro, uma jovem revelação que havia desbancado Moreno da posição. Não
havia muita esperança de chegar ao time titular.
Funcionário do Banco Nacional do
Comércio, Rao foi convidado a ingressar no Athlético Bancário Club, fundado em
agosto de 1927. O primeiro presidente do novo clube foi Willy Teichmann,
ex-jogador colorado e mais tarde presidente do Internacional. No Bancário, Rao
foi campeão da 2ª divisão municipal em 1928, ingressando na divisão principal na
temporada seguinte. Durante as temporadas de 1929. 1930 e 1931, Rao defendeu o
Bancário, inclusive enfrentando o Internacional de seu coração, em partidas do
campeonato.
No final de 1931, o Bancário passou a
enfrentar problemas e abandonou o campeonato, fechando as portas a seguir. Na
temporada seguinte, Rao voltou ao Internacional, defendendo o 2º quadro
colorado até 1934. Foi campeão municipal do 2º quadro em 1932.
Além do futebol e da profissão de
bancário, Rao gostava de samba e carnaval. Foi um dos fundadores da Banda
Filarmônica do Faxinal. E nessa banda, famosa no carnaval porto alegrense nos
anos 1930, Rao desenvolveu outra característica marcante, o bom humor. No
carnaval de 1932, a Filarmônica do Faxinal conquistava o prêmio de humorismo do
carnaval de Porto Alegre. Nessa época, Vicente Rao se denominava o “Carlos
Gomes do Morro da Formiga”. Em 1947 fundou o bloco “Tira o Dedo do Pudim”, que
fez história no carnaval da cidade, apesar de sua curta existência.
Em 1940, Vicente Rao foi convidado a organizar
o Departamento de Cooperação e Propaganda (DCP), a primeira torcida organizada
do Rio Grande do Sul. A ideia era incorporar a alegria e espontaneidade da
torcida nas arquibancadas. A “torcida sincronizada”, como era chamada nos
primeiros tempos, acompanhava o clube em todos os momentos, de jogos de futebol
a partidas de basquete. Bandeiras, serpentinas, buzinas e foguetes tornaram-se
uma constante nos jogos do Internacional. E as faixas provocativas ao rival,
duas delas históricas: “Imitando o negrinho, hem?” e “Morto não fala”.
Em 1947, com o trabalho do DCP a todo
vapor, Rao considerou que poderia deixar seus companheiros seguirem sozinhos. E
assumiu nova tarefa, passando a presidir o Departamento Juvenil do clube. Sob
seu comando, os atletas juvenis não se dedicavam apenas ao futebol, mas também
ao vôlei, basquete e atletismo. E a preocupação com a formação integral dos
jovens atletas era uma constante. No início de dezembro de 1948, em nota
oficial, o Departamento Juvenil decidiu encerrar suas atividades
temporariamente as atividades, para que seus atletas pudessem dedicar-se
integralmente às provas de fim de ano.
“Jogador nº 12” e “Torcedor nº 1”, como
era chamado, Rao foi homenageado em 18 de abril de 1948, com a inauguração de
uma foto sua na sede do clube. Dez anos depois, em 26 de abril de 1959, como
forma de homenagear a torcida colorada pelo cinquentenário do clube, a direção
do Internacional presenteou Vicente Rao com um cartão de prata.
Depois de sair do Departamento Juvenil,
em meados dos anos 1950, logo Vicente Rao voltou a ajudar o clube, participando
de campanhas e promoções, organizando comemorações de títulos e participando da
criação da charanga, para incentivar mais ainda o time nos jogos.
Bancário, Rao dedicou-se também a sua
categoria. Em 1954 foi eleito em assembleia delegado do Sindicato dos Bancários
de Porto Alegre ao Congresso da Federação dos Bancários do RS. Em 1956 seria
eleito secretário da Federação dos Bancários, e 1958, presidente, sendo
reeleito em 1960 e 1962. Por sua ação sindical, nos primeiros dias de abril de
1964 foi preso pela ditadura militar. Libertado no dia seguinte, continuou
respondendo processo até 1970.
Figura ímpar na cultura gaúcha,
especialmente no mundo do samba e carnaval, foi um dos destaques da excursão
cultural da capital gaúcha a Buenos Aires, em 1967, para apresentar a cultura
do Rio Grande do Sul aos portenhos. Em 1949, Rao já era tratado pela imprensa
como o “Folião nº 1”. E em 1951, foi eleito Rei Momo, cargo que manteria até
sua morte, em 1972. Em seu reinado, a festa popular da capital gaúcha viveu seu
auge. Em 1966, ao participar de um
congresso de Rei Momos, em Santos, causou polêmica por não utilizar as
fantasias tradicionais de Momo, no carnaval.
Além de todas essas funções, Vicente Rao
ainda foi Papai Noel oficial de Porto Alegre, a partir de 1957. E participou da
fundação de clubes varzeanos, como o Esporte Clube Internacional da Baixada,
fundado por um grupo de colorados do Partenon, e o Ajax Atlético Clube, formado
por funcionários da Ajax Seguros.
Em 1969, Vicente Rao participou da
fundação da Camisa 12, a mais antiga torcida organizada do sul do Brasil e uma
das mais tradicionais do país. Em 23 de setembro de 1972, as 5:50 da manhã, no Hospital Nossa Senhora da Conceição, o Torcedor nº 1 encerrou
sua existência. (1)
Seu corpo repousa no Cemitério da Santa Casa.
Por todas suas características, por ser
sensível a tudo que emanava do povo, suas esperanças e seus anseios, quando foi
inaugurada a Rua Vicente Rao, em 27 de dezembro de 1973, a placa, além de seu nome,
levava apenas uma descrição sobre o homenageado: Alegria do Povo.
(1) Nas fontes disponíveis na internet há divergência quanto a data da morte de Rao. São citadas as datas de 27 de fevereiro de 1972, setembro de 1972, 12 de dezembro de 1972 e setembro de 1973. A data de 12 de dezembro de 1972 é apresentada na antiga Agenda Histórica do site oficial do Sport Club Internacional. Mas o atestado de óbito de Vicente Rao afirma que a data de falecimento é 23 de setembro de 1972.
Obrigado por compartilhar. Adorei.
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