Total de visualizações de página

domingo, 30 de julho de 2023

Jogadores do passado: Vares

Imagem restaurada e colorizada por Luiz Gustavo Leal Quirim

Francisco Pereira Vares nasceu em Santana do Livramento (RS), no ano de 1892.

Vares mudou-se para Pelotas ainda na infância, provavelmente para estudar. No futebol, ele surgiu no Foot-Ball Club Athletic, onde era atleta e dirigente, em 1908. O Foot-Ball Club, fundado em maio de 1906, era uma dissidência do Club Sportivo Internacional e em outubro de 1908 fundiu-se com esse mesmo clube, dando origem ao Esporte Clube Pelotas. Vares, portanto, foi fundador do Pelotas. No mesmo ano, recebeu do clube a medalha de "Honra ao Mérito", como o atleta que mais se destacou em exercícios físicos.

Em 1911, Vares enfrentou o Combinado Uruguaio duas vezes, defendendo o Pelotas e o Combinado Gaúcho. Já era considerado, na época, o melhor ponteiro-esquerdo do estado. No mesmo ano, completou o ensino ginasial no Ginásio Pelotense e em 1912 ingressou no Instituto de Engenharia, em Porto Alegre. Assim, trocou o Pelotas pelo Internacional.

Vares estreou no Internacional em 5 de maio de 1912, na vitória por 7x0 sobre o Nacional, pelo campeonato municipal, na Baixada. No jogo seguinte, em 2 de junho, o Internacional venceu o Fussball por 4x3, e Vares marcou o terceiro gol colorado. No início de julho, participou da excursão colorada a Pelotas. No dia 9 de julho marcou os dois primeiros gols colorados na vitória por 6x0 sobre o União. Nesta partida o Internacional conquistou o seu primeiro troféu externo, o "Centenário de Pelotas", ofertado pelos educadores Fortunato Pimentel e Alfredo Maciel Moreira. De volta a Porto Alegre, no dia 11 de agosto o Internacional aplicou a maior goleada de sua história, 16x0 sobre o Nacional. Vares marcou quatro gols. Mas o título municipal ficou com o Grêmio.

Na estreia da temporada de 1913, em 8 de junho, o Internacional enfrentou o Grêmio, pelo campeonato municipal, na primeira partida da Chácara dos Eucaliptos. O Grêmio venceu por 2x1, mas Vares fez a assistência para o gol de Túlio. No jogo seguinte, em 22 de junho, contra o Colombo, estreou o ataque Túlio, Galvão, Ribas, Miller e Vares, que encantaria o futebol gaúcho nos anos seguintes. O Colorado venceu por 6x0, e Vares marcou um gol. Contra o Frisch Auf (10x1), Vares marcou mais um gol. O Internacional sagrou-se campeão municipal pela primeira vez em 1913. Em 21 de setembro, no amistoso com o Rio Branco de Pelotas, Vares marcou um gol na vitória por 3x2.

Na temporada de 1914, Vares marcou dois gols no amistoso com o Colombo (6x0), em 19 de abril. Em 10 de maio, na abertura do campeonato, o Internacional venceu o Cruzeiro por 7x0. Vares marcou dois gols e fez duas assistências. Contra o Americano, em 24 de maio, o Internacional venceu por 15x2, com três gols de Vares. Contra o Frisch Auf, 9x0 e mais três gols de Vares. Na vitória sobre o Colombo (2x0), mais um gol de Vares. Esse gol, em algumas fontes, aparece como contra, do goleiro Ettore. Vares chutou com violência, Ettore chegou a tocar na bola mas não conseguiu evitar o gol. No dia 14 de julho, o Internacional bateu o Rio Grande por 5x1, na maior derrota que a equipe riograndina já havia sofrido de uma equipe gaúcha. O esportista Alpheu Paranhos ofereceu uma cigarreira de prata com a efígie de um jogador a quem marcasse o primeiro gol da partida. E logo aos 5 minutos de jogo Túlio cruzou para a área, Vares dominou e chutou para as redes. No final da temporada, veio o bicampeonato da cidade.

Em 25 de abril de 1915, o primeiro jogo colorado foi o amistoso de inauguração da Vila Cruzeiro, novo campo do Cruzeiro. A prtida terminou 2x2 e Vares fez o segundo gol colorado. No campeonato, Vares atuava mais como garçom que como artilheiro. Em 30 de maio fez seu primeiro gol, na vitória por 9x1 sobre o São Paulo. Na campanha do tri, foi seu único gol.

Em 1916 Vares começou a comparecer às redes com mais frequência. No 1º turno, marcou um gol contra o Fussball (8x0) e dois gols contra Cruzeiro (6x2) e Colombo (14x0). No dia 30 de julho de 1916, na Chácara dos Eucaliptos, ocorreu o Gre-Nal do 1º turno. Em grande atuação, Vares marcou os seis gols da vitória colorada por 6x1. Dois gols no primeiro tempo e quatro gols no 2º tempo, a partir dos 20 minutos. (1). No returno, ele ainda marcaria dois gols sobre o Fussball (13x1). O Internacional conquistaria o tetracampeonato municipal nessa temporada.

Em 22 de outubro de 1916 o Internacional venceu o Frisch Auf por 10x4, em amistoso. A equipe teuto-riograndense chegou a estar vencendo por 3x0, mas Vares marcou o gol de empate, ainda no 1º tempo. Foi seu último gol pelo Internacional. No dia 29 de outubro, na Baixada, o Internacional venceu o Grêmio por 3x2, em partida do campeonato. Foi o último jogo de Vares pelo Internacional.

Formado em engenharia, Vares largou a carreira de jogador de futebol, uma prática comum na época do amadorismo. Muito provavelmente retornou à sua Santana do Livramento natal. Ele reaparece na imprensa da capital em 1937, em notícia sobre a formação de um núcleo da Ação Libertadora em Santana do Livramento. Este movimento foi criado para apoiar a candidatura de Armando Salles à presidência da república.

Vares faleceu em Santana do Livramento, em 6 de setembro de 1968.

Seus números no Internacional:
69 partidas
57 vitórias
5 empates
7 derrotas
55 gols
Campeão municipal em 1913, 1914, 1915 e 1916

(1)O jornal A Federação aponta os dois últimos gols para Oswaldo, porém o Correio do Povo e outras fontes, inclusive com o tempo dos gols, citam Vares como o autor dos seis gols.

terça-feira, 25 de julho de 2023

Jogadores do passado: Cigano


Deloy Carlos Viero nasceu em Santa Maria (RS), em 25 de julho de 1959.

Centroavante, recebeu o nome de Cigano. Começou a carreira no São Gabriel, em 1980. Nessa temporada, foi o artilheiro do campeonato gaúcho da 2ª divisão, garantindo ao São Gabriel o vice-campeonato e o acesso inédito á elite do futebol gaúcho. No ano seguinte, Cigano teve destaque na 1ª Fase do Campeonato Gaúcho, apesar do fraco desempenho de seu clube. Marcou 9 gols, incluindo um contra o Colorado. O São Gabriel ficou empatado em pontos com o Juventude na penúltima colocação. Pelos critérios de desempate, o Juventude seria rebaixado, mas na época o regulamento previa um jogo-extra. Em meio à semana que antecedia o jogo decisivo, Cigano estava envolvido em sua transferência para o Internacional. Na partida contra o Juventude Cigano, já negociado, teve fraca atuação. O São Gabriel perdeu e caiu.

Cigano chegou ao Internacional para disputar o Octogonal Final do Gauchão. Foi oficialmente anunciado em 8 de outubro de 1981. Mas ele tinha uma disputa duríssima: o titular colorado era Bira, campeão brasileiro em 1979. E no grupo ainda tinha Jones e Pedro Verdum.

A estreia de Cigano ocorreu em 29 de outubro de 1981, em um amistoso com o Aimoré. Cláudio Duarte escalou vários reservas. Cigano começou no banco e entrou no time substituindo Pedro Verdum. O Internacional venceu por 1x0. Cigano receberia outra chance em 15 de novembro, quando o Internacional perdeu por 2x1 para o São Paulo de Rio Grande, no Aldo Dapuzzo. Cigano saiu do banco para substituir Jaiminho. Essa foi sua última partida na temporada.

Sem ter chances, Cigano acabou emprestado ao Sport, na temporada de 1982. Retornou ao Internacional em 1983, disputando um amistoso contra o Santa Cruz, nos Plátanos, em 1º de maio. O Internacional venceu por 2x1 e Cigano entrou no time substituindo Geraldão. Mas foi seu último jogo pelo Colorado. Depois Cigano seguiria sua carreira jogando no Bagé (1983), Juventude (1984), São Gabriel (1985), São Borja (1985/1987), Glória (1988), Iguaçu PR (1989), Guarany CA (1989/1990), Oriental TM (1990) e Guarany CA (1991/1995).

Cigano enfrentou o Internacional duas vezes pelo São Gabriel, em 1981, perdendo as duas e marcando um gol. Pelo Bagé, jogou uma vez em 1983, empatando. Pelo São Borja foram dois empates em 1987, com um gol marcado. E pelo Guarany de Cruz Alta foram quatro partidas entre 1991 e 1993 (um empate e três derrotas), com um gol marcado.

Seus números pelo Internacional:
3 partidas
2 vitórias
1 derrota
Campeão gaúcho em 1981

segunda-feira, 24 de julho de 2023

Jogadores do passado: Bonzo


Edgar Antônio Fagundes nasceu em Porto Alegre, em 24 de julho de 1931.

Edgar, como ele era conhecido no início da carreira, começou jogando no Força e Luz, onde atuou de 1948 a 1952. Ele jogava tanto de zagueiro como de lateral. Suas boas atuações o levaram ao Renner, onde seria campeão metropolitano e gaúcho em 1954. Nessa época recebeu o apelido de Bonzo.

No início de 1959 o Renner fechou seu departamento de futebol. Sem clube, Bonzo foi procurado pelo Grêmio, que chegou perto de anunciá-lo. Mas para surpresa de muitos, ele acabou contratado pelo Internacional.

Sua estreia ocorreu em 26 de março de 1959, no empate em 1x1 com o Nacional de Porto Alegre, em amistoso no estádio Tiradentes. Mas Bonzo em seguida começou a apresentar problemas físicos, ficando quase um mês sem jogar, voltando a campo em 21 de abril de 1959, no empate em 4x4 com o Botafogo. Nessa partida Bonzo começou no banco e ingressou no time durante o jogo, substituindo Zangão. Ficou de fora do Gre-Nal disputado a seguir, mas jogou contra São José (4x2) e Floriano (0x4). Mas outra vez sai do time por lesão, ficando quase um mês e meio sem jogar. Regressou em um amistoso com o Peñarol (0x0), em Montevidéu, em 19 de junho. E nova parada por lesão, quase um mês parado, regressando na partida contra o São José (1x0) em 12 de julho, já pelo campeonato.

Bonzo garantiu a titularidade, as vezes na zaga, as vezes na lateral-direita. Mas após a derrota para o Floriano (0x1), em 9 de agosto, muitos jogadores, entre eles Bonzo, tiveram sua titularidade questionada. O Diário de Notícias, um pouco exageradamente, definiu a atuação colorada como "a pior de todos os tempos". Mas mesmo cotado para sair da equipe, Bonzo jogou o Gre-Nal, com nova derrota (1x2). Além da derrota, Bonzo sofreu uma lesão nos meniscos, que exigiu duas cirurgias. Em outubro Bonzo voltou a treinar com bola, mas não jogou mais na temporada.

Em 26 de fevereiro de 1960 Bonzo atuou no amistoso com a Portuguesa dse Desportos (0x0). E novamente uma lesão nos meniscos que levou a cirurgia. Em julho Bonzo voltou aos exercícios. Em setembro Teté anunciava Bonzo como titular da linha média para o 2º turno do campeonato, mas novamente problemas físicos o impediram de jogar.

Em 21 de fevereiro de 1961, Bonzo rescindiu seu contrato com o Internacional de maneira amigável. Cotado para ingressar no Cruzeiro, acabou indo para o Pelotas, onde jogou até 1962. Em 1963 jogou no São Paulo de Rio Grande, regressando ao Pelotas em 1964, quando encerrou a carreira.

Bonzo faleceu em 15 de março de 1985.

Seus números no Internacional:
13 partidas
5 vitórias
5 empates
3 derrotas

domingo, 16 de julho de 2023

Jogadores do passado: Godinho


Benjamin Godinho chegou ao Internacional em 1914. Em 5 de abril de 1914, na abertura da temporada, Godinho foi relacionado no 2º quadro. Em 19 de abril de 1914, no primeiro jogo da temporada dos 2ºs quadros, o Internacional venceu o Colombo por 8x1, com três gols de Godinho.

Em agosto de 1914, Godinho viajou com o time principal do Internacional para uma série de cinco amistosos no interior. Ele era reserva da equipe, atuando apenas no último jogo, em 17 de agosto de 1914, vitória por 2x1 sobre o Combinado Gymnasial/14 de Julho, de Bagé. Ele voltaria a campo pelo time principal em 4 de outubro de 1914, na "final estadual". O 14 de Julho de Santana do Livramento não gostou da imprensa gaúcha ficar exaltando o Internacional, chamando-o de "campeão estadual" pelo seu desemepnho no ano. A equipe santanense estava invicta e desafiou o Internacional para um tira-teima. Depois de um empate em 0x0, as duas equipes voltaram a se enfrentar. Ribas, o centroavante titular, não pode jogar, e Godinho substituiu-o, marcando dois gols na vitória por 5x0. (1)

O Diário, 4 de outubro de 1914

Já campeão municipal pelo 2º quadro, Godinho voltaria a campo pela equipe principal em 22 de novembro de 1914, no encerramento da temporada. Jogando de meia, ao lado de Ribas, participou do empate em 4x4 com o Rio Branco de Bagé.

Na temporada de 1915, Godinho começou como titular. No primeiro jogo do ano, em 25 de abril de 1915, na inaguração da Vila Cruzeiro, Godinho atuou no empate em 2x2 com o Cruzeiro. No jogo seguinte, estreia no campeonato municipal, Godinho atuou como meia, com Bendionda de centroavante. O Internacional venceu o Colombo por 3x0 e Godinho fez o primeiro gol. No jogo seguinte, contra o Cruzeiro, Godinho marcou quatro gols na vitória por 7x0. Na terceira rodada do campeonato, o adversário era o São Paulo. O Internacional jogou com três centroavantes (Godinho, Ribas e Bendionda), vencendo por 9x1. Godinho marcou um gol. Na quarta rodada, vitória por 7x0 sobre o Colombo.

Em julho, nova excursão ao interior. Em Uruguaiana, o Colorado bateu o Sul Brasil por 5x1, com um gol de Godinho. Era a estreia na excursão, mas Godinho só voltaria a atuar na última partida, em 25 de julho de 1915, vitória por 5x0 sobre o Riograndense de Santa Maria, com um gol dele. Foi seu último jogo pelo time peincipal em 1915, também. Na volta a Porto Alegre, o ataque colorado seria formado por Túlio, Oswaldo, Bendionda, Miller e Vares. Há uma lacuna na vida de Godinho, após a excursão ao interior. Ele não aparece nem nas escalações conhecidas do 2º quadro.

Na abertura da temporada de 1916, no dia 9 de abril, Godinho jogou o amistoso contra o Americano, participando da vitória por 5x0, marcando dois gols. Voltaria a marcar mais dois gols na partida seguinte, contra o são José, vitória por 6x0. Em 30 de abril de 1916, na abertura do campeonato, o Internacional venceu o Fussball por 8x0 e Godinho, atuando como ponteiro-direito, fez o primeiro gol do jogo. Mesmo assim, o jornal O Diário criticou sua fraca atuação. Foi a última atuação de Godinho pelo time principal, na temporada. Dessa vez ele retornou ao 2º quadro, onde seria campeão municipal.

Na temporada de 1917 Godinho continuou atuando pelo 2º quadro. Em abril, enfrentou problemas de saúde.
A Federação, 30 de abril de 1917

Godinho só voltaria ao time principal em 7 de setembro de 1917. O Internacional enfrentava o Oriental, de Rivera, e o titular Oswaldo não pode jogar. Godinho atuou e marcou o primeiro gol do jogo, que terminou 2x2. Godinho também jogou o amistoso contra o São José (12x1), onde marcou três gols, a partida do campeonato contra o Fussball (3x0) e o amistoso com o Guarany de Bagé (5x1).

Em 1918, Godinho começou a temporada no 2º quadro. Mas em 19 de maio de 1918 ele foi escalado para jogar o Gre-Nal do 1º turno do campeonato municipal, seu primeiro clássico pela equipe principal. O Internacional venceu por 5x3. Em seguida, assumiu a titularidade da equipe, pois Bendionda havia se mudado para Santa do Livramento. Godinho atuou contra o Porto Alegre (5x0), São José (6x0 e três gols dele) e Cruzeiro (1x3). No dia 4 de agosto, na Baixada, ocorreria o clássico que ficou tristemente conhecido como o "Gre-Nal de Sangue". No final do 1º tempo, com o Grêmio vencendo por 1x0, um torcedor gremista, armado de uma faca, esfaqueou o centroavante colorado Ribas. A partida foi suspensa e mais tarde o Grêmio entregou os pontos do jogo. Mas mesmo com a perda de um atacante (Ribas nunca mais jogaria futebol), Godinho saiu do time.

Na abertura da temporada de 1919, amistoso com o Cruzeiro (0x1), Godinho estava em campo. Voltaria a jogar pelo time principal em 1º de junho de 1919, atuando como centromédio, na vitória por 7x0 no São José. Mas logo retornou ao 2º quadro. Em 1920, Godinho jogaria apenas uma partida pelo time principal, sua última. Em 16 de maio de 1920 o Internacional empatou em 1x1 com o São José, pelo campeonato municipal. A partida foi encerrada 15 minutos mais cedo, por falta de luz natural, e os mesmos jogadores voltaram a campo em 23 de maio, para jogar o tempo restante, sem alterar o marcador. Godinho ainda continuaria atuando pelo 2º quadro até o fim da temporada.

Seus números pelo Internacional:
26 jogos
20 vitórias
4 empates
2 derrotas
23 gols
Campeão municipal em 1915, 1916, 1917 e 1920
Campeão municipal de 2ºs quadros em 1914, 1915, 1916 e 1918









































sábado, 8 de julho de 2023

Lupicínio Rodrigues - Porque era gremista?


Existe um texto de Lupicínio Rodrigues que seguidamente é utilizado para atacar o Sport Club Internacional, acusando-o de ter impedido o Riograndense de ingressar na liga oficial de futebol da cidade. Esse texto foi publicado no jornal Última Hora, em 6 de abril de 1963. Vamos ao texto:

Domingo, estive em um churrasco da Sociedade Satélite Prontidão, onde se reúne a "gema" dos mulatos de Porto Alegre. Lá houve tudo de bom, bom churrasco, boa música e boa palestra. Mas como nessas festas nunca falta uma discussão quando a cerveja sobe, lá também houve uma, e foi a seguinte: Uma turma de amigos quis saber por quê, sendo eu um homem do povo e de origem humilde, sou torcedor tão fanático do Grêmio.

Por sorte, lá estava também o senhor Orlando Ferreira da Silva, velho funcionário da Biblioteca Pública, que me ajudou a explicar o que meu pai já havia me contado. Em 1907, uma turma de mulatinhos, que naquela época já sonhava com a evolução das pessoas de cor, resolveu formar um time de futebol. Entre esses mulatinhos, estava o senhor Júlio Silveira, pai do nosso querido Antoninho Onofre da Silveira, o senhor Francisco Rodrigues, meu querido pai, o senhor Otacílio Conceição, pai do nosso amigo Marceli Conceição, o senhor Orlando Pereira da Silva, o senhor José Gomes e outros. O time foi formado. Deram o nome de Rio-Grandense e ficou sob a presidência do saudoso Júlio Silveira. Foram grandes os trabalhos para escolher as cores, o fardamento. fazer estatutos e tudo que fosse necessário para um clube se legalizar, pois os mulatinhos sonhavam em participar da Liga, que era, naquele tempo, formada pelo Fuss-Ball, que é o Grêmio de hoje, o Ruy Barbosa, o Internacional e outros. Este sonho durou anos, mas no dia em que o Rio-Grandense pediu inscrição na Liga, não foi aceito porque justamente o Internacional, que havia sido criado pelo "Zé Povo", votou contra, e o Rio-Grandense não foi aceito. Isso magoou profundamente os mulatinhos, que escolheram torcer contra o Internacional, e o Grêmio, sendo o seu maior rival, foi escolhido para tal.

Fundou-se, por isso, uma nova Liga, que mais tarde foi chamada de Canela Preta, e quando estes moços casaram, procuraram desviar seus filhos do clube que hoje é chamado o "Clube do Povo", apesar de não ter sido ele o primeiro a modificar seus estatutos para aceitar pessoas de cor, pois esta iniciativa coube ao Esporte Clube Americano, e vou explicar como:

A Liga dos "Canelas Pretas" durou muitos anos, até quando o Esporte Clube Ruy Barbosa, precisando de dinheiro, desafiou os pretinhos para uma partida amistosa, que foi vencida pelos desafiados, ou seja, os pretinhos. O segundo adversário dos moços de cor foi o Grêmio, que jogou com título de “Escrete Branco”. Isso despertou a atenção dos outros clubes que viram nos Canelas Pretas um grande celeiro de jogadores e trataram de mudar seus estatutos para aceitarem os mesmos em suas fileiras, conseguindo levar assim os melhores jogadores, e a Liga teve que terminar. O Grêmio foi o último time a aceitar a raça, porque em seus estatutos constava uma cláusula que dizia que ele perderia seu campo, doado por uns alemães, caso aceitasse pessoas de cor em seus quadros. Felizmente, esta cláusula já foi abolida, e hoje tenho a honra de ser sócio-honorário do Grêmio e ter composto seu hino que publico ao pé desta coluna.

Vamos à análise do texto:

1)Fica evidente que, na época do texto, pessoas de origem humilde, em sua maioria, torciam para o Internacional, a ponto de quem era exceção ser questionado sobre sua posição.

2)Em nenhum momento do texto, Lupicínio se refere a negros, sempre utiliza as expressões mulatos e mulatinhos. O Riograndense se definia como "mulato", e só aceitava sócios e jogadores que se enquadrassem nessa definição. (1) Como Fernando Henrique Cardoso aponta, em sua obra "Capitalismo e escravidão no Brasil Meridional", a ideologia do "branqueamento social" atingia parte da comunidade negra, que via na negação da negritude (e adoção da identidade "mulata") uma possibilidade de ascensão social. (2) Gilmar Mascarenhas cita: "O próprio compositor Lupicínio, não obstante seu inegável talento musical, contou com uma rede de contatos para abrir 'portas' e vencer o isolamento da Ilhota, chegando a alcançar fama na capital do País (façanha rara na época): aos 21 anos adquire, através do acesso do pai a um desembargador, emprego de bedel na Faculdade de Direito; casa-se com uma mulher branca numa sociedade onde o índice de exogamia racial é dos mais baixos; torna-se torcedor do Grêmio (clube então racista e elitista), para o qual compõe belíssimo hino. Se Mário Goulart (1984:51) diz que 'Lupicínio teve os amigos e os parceiros certos', acreditamos que não se trata de obra do acaso." (3)

3)"os mulatinhos sonhavam em participar da Liga, que era, naquele tempo, formada pelo Fuss-Ball, que é o Grêmio de hoje, o Ruy Barbosa, o Internacional e outros." Grêmio e Fussball, apesar de fundados no mesmo dia, mês e ano, e representarem a mesma comunidade étnica, sempre foram clubes distintos. O Ruy Barbosa, fundado em 1915, cinco anos depois da primeira liga da capital, só disputou a mesma liga que o Internacional em 1923.

4)"Este sonho durou anos, mas no dia em que o Rio-Grandense pediu inscrição na Liga, não foi aceito porque justamente o Internacional, que havia sido criado pelo 'Zé Povo', votou contra, e o Rio-Grandense não foi aceito." Novamente Lupi se equivoca. Realmente levou anos para o Riograndense pedir filiação a uma liga formada por clubes mais tradicionais. Apenas em 1921 o clube tentou ingressar em uma liga, a dissidente Associação Porto Alegrense de Football, da qual faziam parte Grêmio e Ruy Barbosa, mas não o Internacional. E, enquanto clubes com menos tradição e estrutura, como o Montevideo, Pátria, São João, Endymion, Universal e River Plate foram aceitos, o Riograndense teve seu pedido recusado. (4)

5)"Fundou-se, por isso, uma nova Liga, que mais tarde foi chamada de Canela Preta, e quando estes moços casaram, procuraram desviar seus filhos do clube que hoje é chamado o "Clube do Povo", apesar de não ter sido ele o primeiro a modificar seus estatutos para aceitar pessoas de cor, pois esta iniciativa coube ao Esporte Clube Americano, e vou explicar como:" Ele ia explicar como o Americano foi o primeiro clube a modificar os estatutos e simplesmente não falou mais no clube. E em relação a mudar os estatutos do clube para permitir o ingresso de "pessoas de cor", no Internacional não havia necessidade, por não existir tal proibição. Vejam o que diz o estatuto colorado de 1916, o mais antigo conhecido, sobre os sócios:
Capítulo IV
Dos sócios
Art. 16 - Haverá seis categorias de sócios.
a: Fundadores - os que assinaram a ata de fundação.
b: Beneméritos - os que tenham oferecido ao clube dádiva importante, a juízo da diretoria.
c: Honorários - os que tenham prestado relevantes serviços ao club, a juízo da assembleia geral.
d: Remidos - os que tenham contribuído, de uma só vez, aos cofres do clube, com a quantia de duzentos mil réis.
e: Efetivos - os que pagarem a joia de 10$000 e a mensalidade de 2$000.
f: Correspondentes - os que, em lugar distante, no país ou no estrangeiro, prestarem serviços ao clube.
Art. 17 - Para ser admitido como sócio do clube são condições necessárias:
a: ser maior de quinze anos.
b: ter bom comportamento civil.
c: saber ler e escrever, bem como falar o idioma do país.
d: ser proposto por um sócio, quites com a tesouraria.(5)

6)"A Liga dos 'Canelas Pretas' durou muitos anos, até quando o Esporte Clube Ruy Barbosa, precisando de dinheiro, desafiou os pretinhos para uma partida amistosa, que foi vencida pelos desafiados, ou seja, os pretinhos. O segundo adversário dos moços de cor foi o Grêmio, que jogou com título de “Escrete Branco”. Isso despertou a atenção dos outros clubes que viram nos Canelas Pretas um grande celeiro de jogadores e trataram de mudar seus estatutos para aceitarem os mesmos em suas fileiras, conseguindo levar assim os melhores jogadores, e a Liga teve que terminar." Esses jogos não ocorreram. Disputas entre selecionados de atletas brancos e negros correram em Porto Alegre em 1930, 1931, 1933 e 1942. No jogo de 1931, alguns jogadores do selecionado negro já faziam parte da liga oficial e o Grêmio não cedeu nenhum jogador para o selecionado branco. Os dois convocados não compareceram. Em 1954, o ex-atleta Agostinho, em entrevista, cita um jogo ocorrido em 1929 (não localizado na imprensa) que teria causado o fim da Liga da Canela Preta. Mas boa parte da seleção negra citada por ele já jogava na liga oficial, e novamente o Grêmio não cedeu nenhum jogador para a seleção branca. (6)

7)"O Grêmio foi o último time a aceitar a raça, porque em seus estatutos constava uma cláusula que dizia que ele perderia seu campo, doado por uns alemães, caso aceitasse pessoas de cor em seus quadros." Outra informação equivocada. Essa cláusula nunca existiu e provavelmente nem seria legal, mesmo na época. Além disso, a Baixada não foi doada e sim comprada pelo clube. Além disso, alemães e Grêmio, como coisas distintas, não fazia sentido nas primeiras décadas do clube. O documento de compra da baixada foi assinado pelos dirigentes gremistas Koch, Py, Geyer e Siebel. O "ground" da Baixada era chamado, pelos associados e dirigentes, de Schutzverein Platz e as primeiras documentações do clube eram bilíngues.

8)Por fim, resta a informação de Robinson, irmão de Lupicínio, que diz que seu pai, Francisco Rodrigues, nunca deixou de torcer pelo Internacional, e que o motivo de Lupi ser gremista era a admiração por Eurico Lara.

(1) MASCARENHAS, Gilmar. Futebol e territorialidade da segregação racial em Porto Alegre. Motus Corporis, Rio de Janeiro, v. 5, n.2, p. 58-59, 1998.
(2) CARDOSO, Fernando Henrique. Capitalismo e escravidão no Brasil Meridional. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2003, 5ª ed., p. 330-332.
(3) MASCARENHAS, Gilmar. Esporte e mito da democracia racial no Brasil: memórias de um apartheid no futebol. https://efdeportes.com/efd14b/apart1.htm
(4) A Federação, 24 de março de 1921, página 4.   http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=388653&pesq=&pagfis=45859

sexta-feira, 7 de julho de 2023

Um jogo: Internacional 1x0 Fluminense - 08/08/1937


Com a adesão dos principais clubes da capital gaúcha ao profissionalismo, em 1937, a AMEA (Associação Metropolitana de Esportes Atléticos) carioca se comprometeu a enviar dois de seus filiados para jogarem em Porto Alegre e depois levar um clube porto alegrense para jogar no Rio de Janeiro.

O primeiro clube a visitar Porto Alegre foi o Fluminense. E sua estreia foi contra o Internacional, no Estádio dos Eucaliptos.

No dia 8 de agosto de 1937 ocorreu o encontro. Havia chovido muito em Porto Alegre antes da partida, o que deixou o campo alagado. Na preliminar, duas equipes do futebol varzeano da cidade enfrentaram-se: Portuário e Rio Guaíba. O Portuário venceu por 2x0, gols de Joãozinho e Chuva.

As 15:30 horas entraram em campo os dois clubes, assim escalados:

INT: Penha; Berto e Risada; Zezé Dinarte, Brandão e Lewy; Negrito, Salvador, Sylvio Pirillo, Miguel e Castillo

FLU: Nascimento; Guimarães e Machado; Mílton, Santamaría e Orozimbo; Sobral, Romeu, Sandro, Tim e Hércules

O juiz da partida foi o carioca Guilherme Gomes.

As 15:45 começou o jogo. E logo no início da partida, aos 3 minutos de jogo, Sylvio Pirillo recebeu a bola dentro da área, e vendo Nascimento fechando o canto esquerdo, chutou no canto direito, abrindo o placar. Com o gol sofrido, o Fluminense buscou o ataque, mas quando suas jogadas não eram desarticuladas pela defensiva colorada, acabavam nas mãos do goleiro Penha, que fez 8 defesas no 1º tempo, contra 3 de Nascimento. A partida foi duramente disputada. No 1º tempo o Internacional cometeu 12 faltas e cedeu 4 escanteios, contra 10 faltas e um escanteio do Fluminense. O colorado Lewy, lesionado, foi substituído por Artigas.

No 2º tempo o Fluminense continuou pressionando, obrigando penha a realizar 11 defesas, contra 4 de Nascimento. Mas os cariocas bateram mais, com 8 faltas contra 6 coloradas. Como resultado disso, Brandão e Salvador, lesionados, tiveram que ser substituídos por Giordani e Vicente Souza. Mesmo assim, o resultado de 1x0 se manteve.

Sylvio Pirillo, com seu gol, recebeu todos os prêmios de melhor jogador da partida: um rádio American-Bose, oferecido pela firma Vigg Brothers, um relógio Masson-Esporte, oferecido pela Casa Masson e Rádio Farroupilha, uma capa de borracha, oferecido pela Casa das Borrachas, e um estojo com caneta e lapiseira Hafu, oferecido pela Livraria Cruzeiro.

A partida foi transmitida pela Rádio Farroupilha, com narração de Ary Lund.

O Fluminense ainda disputaria mais duas partidas em Porto Alegre, vencendo o Força e Luz (2x1) e o Grêmio (4x0).

quinta-feira, 6 de julho de 2023

Jogadores do passado: Carlão


Carlão do São Paulo de Rio Grande

Carlos Emmanoel de Souza nasceu em Vitória (ES), no dia 5 de julho de 1951.

Carlão tornaria-se zagueiro no futebol. Seu início de carreira é pouco conhecido. Em 1973, por iniciativa do diretor Fernando Diógenes, do Atlético Acreano, Carlão foi parar no semi-amador futebol do Acre. Jogou três temporadas no futebol acreano, transferindo-se para o Esportivo em 1976. Suas boas atuações o levaram a ser contratado por empréstimo pelo Internacional, em outubro de 1977, para a disputa do campeonato brasileiro.

Carlão estreou no Internacional em 13 de novembro de 1977, na vitória por 1x0 sobre o Caxias, pelo campeonato brasileiro, no Beira-Rio. Era a sexta rodada do campeonato e o Colorado vinha de uma derrota traumática para o Grêmio por 4x0. Nos jogos restantes da primeira fase, com Carlão de titular na zaga, ao lado de Beliato, o Internacional não sofreu gols: Juventude (1x0), Grêmio Maringá (3x0), Avaí (0x0) e Brasília (6x0). Na abertura da segunda fase o desemepnho se manteve, no 0x0 com o América do Rio. Mas depois o time perdeu para São Paulo (1x4) e Corinthians (0x1). Suas atuações na primeira fase do campeonato brasileiro o levaram a ficar em algumas rodadas na segunda posição da Bola de Prata para beque central, e chegou a ter seu nome cogitado para a pré-lista de jogadores convocados para o Mundial da Argentina. Mas as últimas atuações do ano prejudicaram sua imagem.

Na temporada de 1978 Carlão começou como titular. No Chile, disputou o Torneio Triangular Cidade de Viña del Mar. O Internacional venceu o Colo Colo (2x1) e o Everton (1x0) e conquistou a taça. A seguir, o clube foi disputar o Torneio Governador Otávio Lage Siqueira, em Goiânia. Carlão foi titular nos três jogos: Fluminense (0x3), Goiânia (3x1) e Goiás (1x2). Faltavam ainda duas rodadas, mas como os organizadores não realizaram os pagamentos prometidos, Internacional e Fluminense abandonaram o torneio, que continuou apenas com os clubes goianos (além dos dois adversários colorados, mais Vila Nova e Atlético).

A partida contra o Goiás foi a última de Carlão pelo Internacional. Sem ter o empréstimo renovado, o zagueiro voltou ao Esportivo. Após o campeonato gaúcho de 1979, onde o Esportivo fez grande campanha, sagrando-se vice-campeão, Carlão foi jogar no Juventude, para a disputa do campeonato brasileiro. E na temporada de 1980 transferiu-se para o São Paulo de Rio Grande.

Em Rio Grande Carlão fincou raízes. Jogou no São Paulo até 1989. E quando largou a carreira de jogador, tornou-se técnico no mesmo clube.

Carlão casou-se no Acre, com Maria Maia de Sousa. Teve uma filha acreana, Sílvia Karla, e dois gaúchos: Carlos Júnior e Amanda Maia de Sousa.

Carlão faleceu em Rio Grande, em 19 de junho de 2010.

Seus números no Internacional:
13 partidas
7 vitórias
2 empates
4 derrotas
Campeão do torneio Cidade de Viña del Mar em 1978